História do Agricolino “Totõe Puxadinha”
Antônio Carlos Costa Soares,
nascido em 23/07/1952, em Rio Pomba-MG, distrito “Bom Jardim”, antiga estrada que liga Rio Pomba a Tocantins, morando
em ponto equidistante das duas cidades.
Aos 7-8 anos
iniciou alfabetização na única escola rural disponível no distrito, Escola da
“Dona Izola”. Escola particular, sem nenhuma ajuda governamental.
A intenção da
querida e amada Professora assim por todos chamada “DONA IZOLA”, era ensinar aos
alunos a ler , escrever, fazer as operações matemáticas básicas: somar,
diminuir, multiplicar e dividir.
Dona Izola
lecionava para todos seus alunos em um galpão comprido, coberto de sapé, em uma
mesa enorme, que acompanhava todo o comprimento do mesmo.
Veja a
logística por ela adotada: Alunos que entraram no primeiro ano, ficavam no
canto 1 da mesa. Alunos que entraram a dois anos, ficavam no canto 2 da mesa em
frente ao canto 1. Alunos que entraram a
três anos, ficavam no canto 3 ao lado do canto 1. Alunos que entraram a quatro anos,
ficavam no canto 4 em frente ao canto 3.
“ETA LOGISTICA
BOA SÔ!” quando eu tinha dúvida e
ficava com vergonha de perguntar à Dona Izola e com medo de levar bronca,
perguntava à minha irmã em frente que estava no segundo ano.
Para completar
a caracterização da “ESCOLA DA DONA
IZOLA”: Galpão além da cobertura de Sapé, o piso era de terra batida, sem
nenhuma parede ou divisória. Fornecido gratuitamente pelo proprietário rural,
onde o marido da Dona Izola era funcionário.
Quem eram os alunos:
todos os meninos que atingiam a idade de “ESTUDAR”, filhos de outros proprietários
rurais da região e filhos dos agricultores e empregados destas propriedades.
Meu primo veio morar em minha casa, vindo de uma propriedade um
pouco mais distante, para também estudar com a Dona Izola, onde iniciamos no
mesmo ano.
Um detalhe não
tinha reprovação. O castigo para aquele que não conseguia fazer as atividades
didáticos da Dona Izola, era levado para estudar no internato do “Sr. Joãozinho
Loiola” em Tocantins-MG, famoso por aplicar
castigos drásticos aos seus alunos em regimes semelhantes aos escravos. Sem
comentários, pois não conheci o ambiente.
No primeiro ano
aprendia-se conhecer as letras, formar sílabas, conhecer os números e estudar a
tabuada. No final do ano alguns já conseguiam escrever o nome e fazer continhas
simples.
No segundo ano,
começava a formar frases, fazer contas maiores e exercitar ditados auxiliados
pelos colegas do terceiro e quarto ano. O que muitos ainda não dominavam bem.
No terceiro
ano, continuava exercitando ditados, recebendo algumas orientações de ciências,
geografia e história, através de pontos ditados de livros básicos. Na
matemática já aparecia contas de juros simples e contas práticas de peso do porco
abatido para venda, onde teria que abater do peso bruto, o peso da canoa que
abrigava o porco na balança no momento de pesar (Popularmente chamada a venda
do CAPADO GORDO).
O quarto e
ultimo ano era muito parecido com o terceiro, apenas quem tinha maiores interesses
é que permaneciam na escola. Uma boa parte dos que não saíram ao longo de seu
terceiro ano, sairiam ao longo do quarto. Poucos chegavam ao final do quarto
ano.
Assim é que,
fiquei fazendo o quarto ano e meu primo foi pra cidade de Rio Pomba fazer o Terceiro
ano no Grupo Escolar Municipal. Pai dele conseguiu mudar do meio rural para a
cidade.
Ao terminar o
quarto ano, veio o primeiro desafio. Sair para ir estudar na cidade. Dito por
todos que eu não iria deixar a “Barra da saia de minha Mãe”. Mas quando os meus
pais me fizeram esta oferta, não pensei duas vezes, “Tô fora” é nesta que vou
para a casa de meu primo na cidade.
Nestes tempos é
claro, eu já tinha exercitado algumas atividades rurais, da prática comum da
lida diária, que não eram nada fáceis de executar: raspar as “bostas” de boi no
curral, descascar milho com caruncho (ninguém merece), beneficiar o milho no
moinho de pedra (carregava o milho ensacado nas costas do paiol ao moinho), capinar
lavouras, tratar dos porcos, beneficiar fumo (trabalho gostoso de fazer), etc.
Meus pais então
me ofereceram estudar ADMISSÃO com o Cícero, para entrar na Escola Agrícola.
Espécie de um cursinho intensivo de um mês, para prestar o concurso. Para mim
foi uma grande novidade, pois não tinha a mínima ideia do que isto significava.
Vale aqui ressaltar, que nenhum outro aluno da Dona Izola tinha saído para continuar
os estudos.
ADMISSÃO com
Professor Cícero e mais dois irmãos Jânio e Jaime, iniciou-se logo quando mudei
para cidade de Rio Pomba. Todos três professores muito capacitados e exigentes.
Cícero lecionava Português; Jânio Matemática e Jaime Ciências, História e
Geografia.
No primeiro dia
de aula, Cícero iniciou ditado que estava fluindo normalmente, até quando ditou
algo para mim desconhecido: “Ponto Parágrafo”, “Ponto de Exclamação” e “Ponto
de Interrogação”.
Ao ditar um
destes pontos e continuar ditando, eu pedia a ele para aguardar. Na terceira
interrupção ele perguntou o porquê da paralisação. Eu disse, estou escrevendo e
você continua ditando.... Foi quando ele resolveu ver o que eu estava
escrevendo. Literalmente escrevia no ditado o que escrevi acima, pois não conhecia
a grafia dos mesmos. Quando o professor Cícero viu teve de segurar firmemente a
sua boca para não rir. No final da aula, me deu instruções para entendimentos.
Por estas e
outras observações, ficou claro que eu não tinha nenhuma base para prestar o
concurso da Escola Agrícola o que foi comprovado com minha reprovação no mesmo.
Desta forma fui fazer o 4º ano no Grupo Escolar São José em Rio
Pomba, onde meu primo estudava. Ele na classe de Elite e eu na Segunda Classe.
Concluído o
Grupo, fizemos a admissão e ingressamos os dois juntos na mesma sala, no Ginásio Estadual Professor
José Borges de Moraes em Rio Pomba.
Neste ocorreu uma
passagem histórica marcante, também por falta de base: Professor de Português,
Ubirajara Pinto de Deus, muito enérgico e dono de uma didática formidável para
ensinar que nunca mais encontrei, adotava critérios de avaliação com provas
mensais, sabatinas escritas quando achava que devia aplicar e arguições diárias
sobre o dever passado para casa, aplicado no livro adotado, contido aí 5 a 10
questões, da seguinte forma: ao chegar em sala de aula rezava o Pai Nosso
rapidamente e daí já colocava a mão no bolso do jaleco e tirava um número sorteado
para vir ao quadro e responder duas questões do dever que ele ditava para o sorteado
escrever no quadro negro.
Daí gerava uma
nota de 1 a 10, da mesma forma que as outras avaliações. Esta arguição tinha um
peso menor que a sabatina e esta um peso menor que a prova. Para mim que não
tinha uma base boa do Grupo Escolar, eu tinha muita dificuldade de acompanhar o
ritmo do professor Ubirajara, mas dava uma sorte tremenda, pois nunca era
sorteado para arguição.
Se fosse sorteado
certamente viria nota ruim, que baixaria a nota da prova no final do mês. Mas
já no início do segundo semestre entrou uma matéria de verbo que eu dominava melhor
do que as outras e peguei muito gosto, dando muito sorte de ser arguido por
várias vezes e tirando notas 8 a 10.
Logo em seguida
entrou outra matéria que eu não estava conseguindo absorver nada. Não dei muita
bola não, acreditando na sorte de que não seria igualmente antes do verbo receber
o chamado da arguição. Engano meu, fui o primeiro a ser chamado ao quadro após
o Pai Nosso. Não acertei quase nada.
Mas o professor não levou neste dia, uma quinta feira, o Diário de Classe, onde
ele anotava todas as notas. Desta forma o professor pediu ao colega Ricardo Mattos,
referência da turma pela alta inteligência, porém quase não enxergava, para
anotar os arguidos com suas notas. Na próxima aula na terça seguinte, ao chegar
em sala, o professor Ubirajara pediu ao Ricardo para passar a nota dos
arguidos. Ricardo sem nenhuma anotação olhou com sua costumeira dificuldade,
quase que apalpando me abordou: você foi arguido Antônio Carlos e caminhou até
o Diário de Classe e olhou as notas grandes que eu havia tirado naquele mês e
voltou-se para mim e disse: foi oito não foi Antônio Carlos? Eu mais que
ligeiro respondi que SIM. Mas outro
colega, meio bichoso logo virou e disse: não, foi dois. Tive que arrumar forma
enérgica de fazê-lo calar. Na semana seguinte, professor Ubirajara chega na
sala de aula e após o Pai Nosso, manda arrancar uma folha do caderno para
Sabatina, quando enterrei até os cabos. No
final do mês na prova não fui bem. Professor
Ubirajara na semana seguinte chega com as notas do mês e joga a maior indireta:
“Tem aluno aqui que está me avacalhando, tira nota boa nas arguições, não
estuda para a sabatina e me tira nota ruim na prova. ALUNO COM ESTA CONDUTA
comigo não passa, até o final do ano eu acabo com estas notas boas dele”. Tive
que fazer das tripas o coração para não receber esta punição.
Com minha
aprovação no primeiro ginasial, meu destino foi outro. Meus queridos pais já
tinham se articulado para conseguir uma transferência para Escola Agrícola,
através de nosso saudoso Professor Aristóteles Ottoni Cardoso (Tote) e nossa querida Professora Maria Marotta, que
levaram o assunto para o Dr. Último de Carvalho, idealizador e fundador da
Escola. Dr. Último mandou chamar meu pai
e foram em comitiva visita-lo com nosso parente Nonô Costa de quem ele gostava
muito, pois dominava a política no nosso distrito. Neste dia todos os presentes,
professor Tote, Dona Marota, Nonô e Papai, souberam definir o meu perfil e
depois de muita conversa e prosa, Dr. Último definiu: “Eu idealizei e fiz a
Escola Agrícola para meninos nascidos na roça, filhos de produtor rural e
agricultores, com aptidões do meio rural, e tenho o maior prazer e orgulho de
pedir ao Dr. Carlos Bastos, então diretor na época, para ingressar este menino
na Escola”.
Em comemorações
recentes, início de 2016, no hoje IFET ou simples IF, sendo homenageado no
evento o filho do Dr. Último de Carvalho,
em discurso relembrou estes dizeres do pai. Na fundação da Escola desde
o seu primeiro discurso, meu pai não cansou de afirmar que a Escola estava
sendo feita para filhos de produtores rurais e agricultores. Que bela percepção
teve este grande homem, construindo a Escola para todos nós. O que ele nos deu,
ninguém tira, pois está na nossa formação, base de todo nosso conhecimento
vivido e aplicado no dia a dia.
Na Escola gostaria
apenas de destacar o meu início, pois ingressei no segundo ano de Mestre Agrícola,
juntamente com nosso saudoso colega Roberto Caetano Gonçalves (Betinho). Na
sala de aula com quem fiz primeiros entendimentos foi com o colega Carlos Eugênio Martins (Cacá de
Rodeiro), Antônio Carlos Motta (Toninho de Rio Pomba). Na primeira prova de matemática,
com Professor Hênio Pereira , quando acertamos
tudo, eu e o Toninho. Eu tinha sido aluno do Professor
Hênio no Ginásio em Rio Pomba, conhecia bem o jeito de suas provas. Eu e Toninho
estudamos juntos e faturamos a nota 10. Na aula seguinte, Sr. Hênio esqueceu as
provas em casa e limitou-se a dizer que o resultado das mesmas, os dois Antônios
de Rio Pomba tinha o “Gabarito”, pois eram os únicos que tinham acertado tudo.
Quem lembra da grande gozação que foi de todos os outros colegas!......Foi
muito bom, pois facilitou assim o entrosamento com a turma.
Existe ainda
uma série de casos e causos ocorridos na Escola, que em outras oportunidades podemos
apresentar.
UM
GRANDE ABRAÇO A TODOS IRMÃOS AGRICOLINOS