Professor
Wilson José de Melo
Os mesmos alunos veteranos que
fizeram questão de raspar as nossas cabeças tornaram-se nossos cúmplices e
orientadores para as malandragens da Escola. Deram dicas, conselhos, ensinaram o
pulo-do-gato.
O Professor de História era o Dr.
Wilson José de Melo, advogado conceituado na Comarca de Rio Pomba. Em suas
aulas de História Geral nos ensinou sobre a Mesopotâmia, rios Tigre e Eufrates, Sumérios, Assírios e Caldeus,
Nabucodonosor, Babilônia, Ciro (Pérsia), Alexandre (Macedônia), Império
Romano, Civilização Grega, Inca, Maia e
Asteca, Faraós, Pirâmides, Exército Mongol,
Genghis Khan, Bárbaros, Visigodos e Vikings, Gregos, Troianos, Esparta,
Egípcios e Romanos, Roma, Tróia, Atenas e Constantinopla.
Apesar deste vasto conteúdo
programático, explicado didaticamente com até desenhos elucidativos no quadro
negro, o Dr. Wilson não corrigia as provas da maneira formal e usual. Fazia uma
leitura dinâmica ou nem isso das provas e aplicava a nota que achava ser a mais
justa.
E aí é que vinha o conselho dos
veteranos. Se você preencher as quatro páginas do papel almaço ganha nota boa,
talvez consiga até um dez. Se não conseguir encher todas as páginas, ou seja;
quanto menos páginas escrever, menor será a nota.
E seguindo estas recomendações
muitos alunos ganharam notas boas. Passaram de ano, sem estudar.
Eu nunca soube usar da mentira. Por
timidez, covardia, ou exemplos caseiros, nunca usei desse expediente para obter
boas notas. Por isto ia tirando notas medianas, mas suficientes para passar de
ano.
Esta metodologia de preencher as quatro
páginas de papel almaço funcionou perfeitamente no primeiro ano do ginásio,
quando estudávamos "História do
Brasil".
Mas no segundo ano; Ah! o segundo
ano foi diferente. A programação era "História
Geral". E antes que me reporte
ao transcorrer do segundo ano ginasial, devo dizer que as aulas do Professor Wilson
era um show à parte.
Gostava de usar óculos escuros. Difundia
aos alunos que conseguia ver o que ocorria na sala mesmo estando de costas para
as carteiras, com o rosto quase colado ao quadro negro, enquanto ministrava as
suas aulas. E nós inocentes meninos, a maioria da roça, pequenas cidades do
interior, tendíamos a crer nesta esparrela.
O fato é que o Dr. Wilson era um observador
perspicaz. Percorria a sala identificando pequenos detalhes. Um aluno estava
manuseando revistinhas do Carlos Zéfiro, outro estudando no livro do Domingos
Paschoal Cegalla, uns e outros tagarelando, jogando conversa fora. Guardada
esta informações ia para o quadro negro fazer os seus desenhos, explanar a
matéria do dia. E de repente sacava, de costas para a turma: "fulano
guarda esta revistinha senão eu lhe tomo e jogo fora"; "sicrano a
aula é de história e não de português"; "beltrano pare de tagarelar".
E bestificados achávamos que ele
realmente estava enxergando com o auxílio dos óculos escuros. Tínhamos até uma
teoria que ele refletia no quadro negro tal qual um espelho.
Ele tinha o costume de aplicar provas
simultâneas para duas turmas. Passava as questões para uma sala e depois ia
para a outra, deixando a primeira sala sem ninguém tomando conta. Depois
voltava e ia tomando provas, aleatoriamente, de alunos alegando que estavam
colando. Mas quem é que não estava colando?
Dizia que possuía poderes
telepáticos. E nós meninos, crentes, acreditávamos. E tinha dias que antes de
começar as aulas, colocava para fora da sala os mais bagunceiros, mais da metade.
Dizia que era a "Turma do Tergal". A turma do "senta-levanta".
Os que não paravam quietos nas suas carteiras. Na época tinha uma propaganda da
TERGAL dizia que "o tecido que não amarrota".
Dr. Wilson também criou a "Turma
do Cemitério". Era o pessoal que tinha
enterrado na prova. Tirado ZERO. Era a turma que usou o recurso de "encher
linguiça" para preencher as quatro páginas do papel almaço com assuntos
desconexos, não relacionadas com as questões solicitadas.
Foi o que começou a acontecer no
segundo ano ginasial. E o Dr. Wilson passou a corrigir as provas
tim-tim-por-tim-tim.
E leu respostas do tipo assim: "Pelé
passou a bola para o Didi, que driblou um, passou para outra jogador, e
entregou a pelota para o Garrincha e...". Acontece que as perguntas eram
sobre Cleópatra ou Egito ou a Mesopotâmia. Lógico que quem assim procedeu,
descreveu uma partida de futebol ao invés de falar sobre a resposta de história
levou ZERO, E nem podia reclamar. E foi difícil para a "Turma do
Cemitério" se recuperar do ZERO recebido.
Quase todos os alunos ficaram para a
prova final. O único que passou direto sem precisar da prova final foi o Carlos
Eugênio Martins, o meu amigo Cacá de
Rodeiro. Muitos ficaram para a segunda época. Alguns tiveram que repetir o ano.
Mas
o maior ensinamento do grande e inesquecível Professor Wilson José de Melo nos deixou, além de todas as belas
aulas de História Geral e do Brasil, foi a semente que ele plantou na cabecinha
daqueles meninos de 12, 13, 14 anos "quando
a esperteza é muita engole o esperto". Não vale a pena ser desonesto.
Eu aprendi esta lição e agradeço de público
ao Professor Wilson este ensinamento.
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